PITA FOGO BARRETOS

PITA FOGO BARRETOS

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Eu, Deus, as galinhas e o cachorro

-- "Quem mora nesta casa?"
Perguntei numa tarde de agosto de 1997 ao aposentado Gentil Prata, pai do misto de cozinheiro e berranteiro Adelino Prata, o afamado Sarará.
-- "Eu, Deus, as galinhas e o cachorro".
Assim respondeu aos 84 anos o velho comissário de comitivas boiadeiras, nascido em São Francisco de Sales, MG, filho de José Prata e Maria Francisca Prata. Do signo de Touro, era morador em Barretos desde 1953. A casa em questão ficava na rua 38, entre as avenidas 31 e 33, na Vila Baroni.
Durante mais de 40 anos Gentil Prata foi comissário de comitiva. Cuidadoso, escolhia “a dedo” os seus contratados para transportar boiada pelos rincões brasileiros. Havia muito peão “amolante”, que gostava de confusão, encrenqueiro, enjoado, reclamador, queixoso de tudo....
-- “Se o cozinheiro lhe oferecia uma canequinha de pinga ele queria duas. Se dava duas, pedia três. Recebia três, desejava a garrafa....”
Vindo de Minas Gerais, o comissário mudou-se para Paulo de Faria, SP, em 1933. Naquela época, trabalhava como peão, mas aos poucos foi comprando uns “burrinhos” até formar sua própria comitiva. Buscava gado no Centro Oeste, trazendo-o para “engorda” em Icem, SP, onde havia muita invernada. Depois, os animais seguiam para Barretos, onde eram abatidos no Frigorífico Anglo, Charqueadas Minerva e Bandeirante.
Gentil Prata contou que cerca ocasião vinha trazendo uma boiada de Rondonópolis, MT, para Riolândia, SP. Eram 1.200 cabeças de propriedade de Fiíco Ribeiro, pai do ex-prefeito barretense Ari Ribeiro de Mendonça. Na culatra (final da boiada) estavam Belmirão e Santo. No trajeto, se desentenderam. Um peão não conversava com o outro. Estavam de mal. O pouso tinha acontecido na currutela (vilarejo menor que cidade) de Santo Antonio, perto de Três Lagoas, MS. A certa altura da marcha, enquanto o comissário contava os bois, Santo resolveu ir até Belmirão. Sentindo-se provocado, o culatreiro esbravejou:
-- “Aonde ocê vai, nêgo sem-vergonha, Fio da Puta???”
-- “Fio da Puta é ocê!”
Foi o que respondeu Santo imediatamente.
-- “Entonce ocê não vai mais pro Barreto. Eu vô ti matá, disgraçado!...”
Assim que gritou, Belmirão partiu para cima de Santo. Amarelado, ele pisou quente, meteu a espora na mula, que escoiceava. O animal passou perto de um precipício, esbarrancando-o.
-- “Se cai lá em baixo, morre na certa!”
Advertiu com firmeza Gentil Prata.
Porém, o fujão conseguiu bater em retirada, escapando de seu perseguidor. E a viagem continuou, sem os dois trocarem palavra ou olhar. Entregue a boiada, o comissário pagou-os em Barretos. No outro dia, encontrou-os juntos, bebendo cerveja no Café Goiano. Amizade refeita...

 
(a história continua na próxima postagem)

Publicado originalmente no jornal O Diário, edição de 19 de agosto de 1997, com o título “Gentil Prata no tempo das comitivas”.

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